Muitas formas de se ver uma loja
Um assunto abordado freqüentemente em
arquitetura de varejo é a iluminação. Uma componente das mais
importantes em um projeto de loja. Os cuidados com a sua conceituação
e execução são importantíssimos, sendo altamente recomendada –
para projetos que demandem maior especialização – a contratação
de consultoria específica, onde aliás, o mercado brasileiro têm
grandes profissionais e empresas à disposição.
Mas neste artigo eu gostaria de tratar de
um tema que precede a iluminação, a visão. Sendo a visão o
primeiro sentido humano a receber estímulos quando um indivíduo,
está por assim dizer, em “modo de consumo”, isto é, está
circulando, disposto a adquirir um produto ou a receber informações
e direcionamentos que o levem a tão comentada compra
por impulso. O resultado dos
estímulos e da interpretação do que nos chega através da visão é
o que a psicologia chama de percepção visual.
Os estímulos nos ambientes de varejo – e
por conseqüência no consumo – estão ligados também a outros
sentidos como olfato e audição, mas é a visão o que primeiro
aproxima o cliente de um produto e inicia o processo de decisão. Em
seu livro Merchandising no Ponto-de-venda, Regina Blessa cita
Veronis, Shler & Assoc, relacionando os sentidos humanos na
percepção e como aprendemos, sendo: 1% pelo Paladar, 1,5% pelo
Tato, 3,5% pelo Olfato, 11% pela Audição e 83% pela Visão.
Com anos de experiência na exploração
desta característica da percepção e do aprendizado humano, os
ambientes de varejo continuam sendo projetados com direcionamento
para a primeira experiência do contato visual. Cores, formas,
volumes e texturas são explorados com eficiência, por arquitetos e
designers, em seus projetos. Paredes, pisos, displays e vitrines têm
mostrado soluções criativas e inovadoras quando o assunto é
percepção visual e estímulo às vendas.
Mas, uma questão fundamental pode estar
sendo deixada em segundo plano. Nem
todas as pessoas enxergam da mesma forma.
Homens e mulheres diferem em capacidade de
enxergar à longa e à curta distância. Estudos apontam que estas
diferenças são atribuídas a questões relativas a programação
cerebral resultante de diferentes tarefas exercidas na evolução
humana. Homens demonstram maior capacidade de focalizar à longas
distâncias pelo fato de terem se dedicado à caça em campos abertos
e mulheres tem melhor capacidade de focar à curtas distâncias por
se dedicarem a coleta de alimentos ao alcance das mãos.
Independente desta diferença de gênero,
tanto homens quanto mulheres perdem, ao longo da vida, a capacidade
de distinguir detalhes dos objetos.
Diminuição da acuidade visual em relação
à idade.
- IDADEACUIDADE VISUAL20 anos100%30 anos96%40 anos90%50 anos84%60 anos75%70 anos60%
Fonte: PILOTTO. P.36. 1980.
Extraído de LIMA, Mariana. Percepção Visual Aplicada a Arquitetura e Iluminação.
Os ambientes de varejo devem levar em conta
estas características humanas, direcionadas ao seu público-alvo.
A atenção a estes detalhes na hora de
montar um espaço comercial pode trazer sensíveis diferenças e
aproximar os consumidores com o conceito da empresa, atuando, também,
como facilitador de identificação do consumidor com a loja. Quanto
mais agradável é a experiência de compra neste ambiente, maiores
são as conversões em venda e a fidelização.
Recursos de layout e design de mobiliário,
mas principalmente de iluminação, podem ter atenção especial em
certos pontos, dependendo do público consumidor.
Tomemos como exemplo uma loja voltada para
o público masculino. Ela pode ter uma distribuição de mobiliários
mais ampla e com certa altura que privilegie a visualização do mix
de produtos com amplitude visual maior possível. O público
masculino tende a se sentir melhor em lojas em que possam ver todo o
ambiente (e suas ofertas) em poucas ou em uma única visada. A
iluminação pode acompanhar este conceito sendo projetada para
valorizar tanto as áreas expositoras quanto as circulações. O
consumidor do sexo masculino também tende a prestar bastante
atenção, e valorizar, o modo como a circulação é feita, como ele
entra, percorre toda a loja e sai sem problemas.
Já para uma loja voltada ao público
feminino as abordagens podem ser diferentes. As consumidoras em geral
não se incomodam, e até gostam, de fazer um percurso que lhes
permita descobrir
gradualmente o interior da loja, percorrendo os corredores para
encontrar os produtos oferecidos. Neste quesito a iluminação
pontual dos produtos faz muita diferença. Uma iluminação que
valorize todos os detalhes dos objetos e desperte o interesse pelo
toque e conseqüentemente sua aquisição. As circulações neste
caso tendem a ter uma iluminação secundária e mais fraca, para na
verdade enfatizar os locais de exposição.
Um outro exemplo onde as diferentes
características de percepção podem valorizar o ambiente comercial,
são as lojas freqüentadas por públicos a partir dos 60 anos de
idade. Faixa etária que aliás tem aumentado sua influência no
consumo da população economicamente ativa, devido ao aumento da
expectativa e da qualidade de vida.
Varejos como farmácias, supermercados e
lojas de departamento devem estar atentos não só na disposição de
seu mobiliário, circulação e iluminação mas também em sua
comunicação visual. A sinalização deve ser suficientemente
perceptível a diferentes distâncias, principalmente naquelas lojas
onde a distribuição de seções, setores e produtos podem ser
alteradas com freqüência. Etiquetas de preço e informação de
produtos devem permitir que pessoas com diferentes níveis de
acuidade visual possam extrair delas toda a informação que precisam
para formar suas decisões de compra.
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Lente
de aumento posicionada junto às gôndolas para facilitar a leitura
de preços e informações. CVS/pharmacy – Ohio – EUA. Acervo do
autor.
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Claro que, para cada loja e cada conceito
de projeto, sempre existirão inúmeras possibilidades a serem
estudadas e exploradas. Fatores como estratégia competitiva,
orçamento, localização e porte do negócio, influirão nos
caminhos a serem seguidos. Mas a atenção a detalhes de projeto como
estes pode fazer toda a diferença, e se tornar mais um diferencial
competitivo da loja.
BLESSA, Regina. Merchandisign no Ponto-de-Venda. 4ª edição. São Paulo: Atlas, 2009.
LIMA, Mariana. Percepção Visual aplicada a Arquitetura e Iluminação. Rio de Janeiro: Editora Ciência Moderna, 2010.
STANCEY, Helen. Men And Women See Things Differently. British Journal of Psychology. Acessado em 24/03/2012 em http://www.medicalnewstoday.com/releases/159279.php
Flávio Radamarker
Muitas formas de se ver uma loja
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